sábado, 19 de setembro de 2009

Catar feijão - João Cabral de Melo Neto

Catar feijão se limita com escrever:
Jogam-se os grãos na água do alguidar
E as palavras na da folha de papel;
e depois, joga-se fora o que boiar.
Certo, toda palavra boiará no papel,
água congelada, por chumbo seu verbo;
pois catar esse feijão, soprar nele,
e jogar fora o leve e oco, palha e eco.

2.

Ora, nesse catar feijão entra um, risco
o de que entre os grão pesados entre
um grão imastigável, de quebrar dente.
Certo não, quando ao catar palavras:
a pedra dá à frase seu grão mais vivo:
obstrui a leitura fluviante, flutual,
açula a atenção, isca-a com risco

Um comentário:

Phatrick Rocha Correia disse...

Esse é um dos textos mais importantes d João Cabral de Melo Neto e reflete algo muito curioso de entender o seu processo de criação que é o ato de escrever. Algo que eu considero muito desafiador e instigante. As principais figuras de linguagem nesse texto é a metalingugem e a analogia.